HITLER: SEM NOVIDADE NO FRONT

HITLER: SEM NOVIDADE NO FRONT

Ricardo Barros Sayeg

Hitler era um amante do cinema. Quase todos os dias, ao final da tarde, reunia seus colaboradores e amigos mais próximos para uma sessão. Costumava conversar e avaliar os filmes após sua exibição.

Mas nenhum filme incomodou tanto o chefe do Estado nazista como Sem Novidade no Front. E por quê?

Sem Novidade no Front (disponível na internet) mostrava que a imagem e a experiência da guerra eram mais importantes que a oratória e, como sabemos, Hitler era um grande orador populista.

O filme começa com um professor de ensino médio fazendo uma preleção aos seus alunos, onde enaltecida a guerra e o amor à pátria no decorrer da Primeira Guerra Mundial:

"Vocês são a vida da Pátria, vocês garotos! Vocês são os homens de ferro da Alemanha! Vocês são os alegres heróis que irão repelir o inimigo quando forem chamados a fazer isso!"

As cenas do professor discursando são intercaladas com jovens na sala de aula imaginando o heroísmo da guerra. 

Entretanto, ao se dirigirem ao front de batalha, muitos garotos vêem soldados feridos, mortos, com descontrole emocional e percebem que a guerra não era nada daquilo que seu professor dizia.

Passados alguns minutos do filme um dos soldados, convencidos pelo professor, retorna da guerra e vê a cidade vazia: o comércio fechado, gente reclusa em suas casas, os desfiles não existem mais. Ele então encontra seu professor que fica encantado ao vê-lo. E diz a um novo grupo de alunos: vejam que exemplo de soldado "forte, bronzeado e alerta." e resolve dar a palavra a Paul. Só que o discurso de Paul vai contra o que o professor havia proferido:

Ele diz que não é bonito e doce morrer pela pátria; antes é sujo e doloroso.

Quando o professor protesta, Paul se dirige aos estudantes e diz: 

"Vão lá e morram!" - e depois voltando-se para o professor "Ah, mas se vocês me permitem, é mais fácil dizer 'vão lá e morram' do que fazer isso."

Hitler, ao assistir esse filme achou-o potencialmente perigoso porque ele retira o poder da palavra e dá poder à experiência e à ação.

Não à toa, quando o filme foi exibido numa sala de projeção em Berlim, a juventude nazista comandada por Goebbels interrompeu a sessão, gritando e soltando ratos entre os espectadores.

Hitler e Goebbels temiam que a palavra perdesse força quando comparada à experiência da guerra.

Ricardo Barros Sayeg é diretor de escola da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo e professor da FIAP/SP.

Fonte: 

URWAND, Ben. O PACTO ENTRE HOLLYWOOD E O NAZISMO - Como o Cinema Americano Colaborou com a Alemanha de Hitler. São Paulo: Leya, 2013.


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