O BRASIL DE MÉDICE: "AME-O OU DEIXE-O!"

O BRASIL DE MÉDICI: "AME-O OU DEIXE-O"
Ricardo Barros Sayeg

O presidente general Emílio Garrastazu Médici era um amante do futebol. Constantemente comparecia aos campos onde eram disputadas diversas disputas. Graças à uma máquina de propaganda de governo, o presidente que comandou o Brasil de 1969 a 1974 terminou seu governo com uma popularidade bastante elevada, mesmo em um dos períodos mais sombrios e obscuros de nossa história. Era a época do Brasil: “ame-o ou deixe-o”
O governo de Médici se beneficiou da onda de otimismo e ufanismo que se alastrava pelo país no período. Pela primeira vez o brasileiro assistiu pela televisão, ao vivo, à Copa do Mundo. O time de Zagallo, tendo Pelé como principal ídolo, encantou o mundo com seu futebol-arte e deu ao Brasil mais uma Copa. A conquista do tricampeonato no México serviu também para neutralizar o que acontecia nos porões dos quartéis do Exército e nos órgãos de repressão.
De 1969 a 1974, o Brasil viveu o “milagre econômico”. A cada ano, o PIB crescia acima de 10% e os investimentos estrangeiros, principalmente oriundos da indústria automobilística, chegavam abundantemente. A população começou a ter uma percepção bastante positiva do governo.
O dinheiro da exportação de petróleo pelos países da OPEP foi emprestado a juros baixos a países como o Brasil. Mas os juros subiram muito a partir da década de 1970 e a dívida externa explodiu.
O capital emprestado que entrava no país, aliado à construção de obras de grande porte, colaborou para consolidar a visão que o país crescia como nunca. A expansão das telecomunicações e a construção de obras monumentais fizeram parte desse projeto do Brasil como grande potência. A Rodovia Transamazônica, a Hidrelétrica de Itaipu e a Ponte Rio-Niterói impulsionaram as empreiteiras, que passaram da atuação nacional para a projeção internacional.
É óbvio que havia corrupção nos processos, mas a censura à imprensa e a ausência de fiscalização não permitiam avaliar o quanto foi roubado, como acontece nos dias atuais. Não havia Ministério Público nos moldes criados pela Constituição de 1988 e a Polícia Federal não tinha a autonomia necessária para investigar.
O milagre econômico não chegou para todos. O modelo de concentração de renda não resolveu problemas estruturais, como a gigantesca desigualdade social brasileira.
Delfim Neto, ministro da Fazenda na época dizia: “vamos fazer o bolo crescer para depois dividi-lo.” O bolo de fato cresceu, mas jamais foi dividido, ou seja, o povão permaneceu na mesma.
Houve forte reação ao regime autoritário durante o governo Médici. Antigos membros do Partido Comunista Brasileiro (PCB), como Carlos Marighella, insatisfeitos com as orientações do partidão que não aprovava a luta armada começaram a organizar movimentos como A Aliança Libertadora Nacional (ALN) e o Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8). Nesse momento houve um aumento da repressão acompanhado de um fortalecimento de ações armadas.
Em 1967 se iniciaram as atividades dos grupos armados. O objetivo dessas organizações era combater o regime por meio de guerrilhas, tanto urbanas quanto rurais. Para financiar essas ações eram organizados assaltos a bancos, instituições financeiras, entre outras instituições. Em 1969 ocorreram o sequestro do embaixador norte-americano Charles Elbrick, no Rio de Janeiro, além do roubo do cofre do ex-governador de São Paulo, Adhemar de Barros, conhecido pelo epíteto: "rouba, mas faz."
A morte de Marighella e de Lamarca marcaram o final da luta armada no Brasil, mas as marcas da repressão e do terror daqueles tempos permanecem vivas na memória e no corpo de muitos brasileiros.

Ricardo Barros Sayeg é diretor de escola da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo e professor da FIAP/SP.

Fontes:

LIMA, Luíz Octavio de. OS ANOS DE CHUMBO: A MILITÂNCIA, A REPRESSÃO E A CULTURA DE UM TEMPO QUE DEFINIU O DESTINO DO BRASIL. São Paulo: Planeta, 2010.

Curso: O QUE FOI A DITADURA: A ÁRDUA CONQUISTA DA DEMOCRACIA - 35 ANOS. São Paulo: Folha de São Paulo, 2020

Médici: "Brasil: ame-o ou deixe-o"


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